TEORIAS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS – PARTE 2
As teorias das políticas públicas são fundamentais para entender a forma como os governos elaboram, implementam e avaliam suas políticas. Dentre as principais teorias, destacam-se a Teoria da Escolha Pública e a Teoria da Escolha Racional, que enfatizam a busca pelo interesse próprio e a maximização dos ganhos individuais na tomada de decisão dos atores políticos. O Incrementalismo, por sua vez, propõe que as políticas públicas se desenvolvem de forma gradual e cumulativa, com ajustes incrementais ao longo do tempo. Já o Institucionalismo destaca a importância das instituições e suas regras na estruturação das políticas públicas. A Teoria dos Fluxos Múltiplos, por sua vez, enfatiza a diversidade de atores e fatores envolvidos na formulação e implementação de políticas públicas. Por fim, a Teoria do Equilíbrio Pontuado propõe que as políticas públicas são moldadas por momentos de estabilidade seguidos por períodos de mudança significativa.
TEORIA DA ESCOLHA PÚBLICA
A teoria da escolha pública é uma corrente teórica que se desenvolveu no campo da ciência política e da economia, que busca explicar como as decisões políticas são tomadas em sociedades democráticas. Essa teoria parte do pressuposto de que os atores políticos, incluindo os governantes, funcionários públicos e eleitores, agem de forma racional e buscam maximizar seus próprios interesses.
Os defensores dessa teoria argumentam que o processo político pode ser analisado a partir de uma série de modelos matemáticos que se baseiam na teoria microeconômica, aplicada ao comportamento dos atores políticos. Dessa forma, a teoria da escolha pública busca explicar como as decisões políticas são tomadas a partir de interesses conflitantes, e como os atores políticos buscam maximizar seus próprios ganhos.
Um dos principais expoentes da teoria da escolha pública foi o economista James Buchanan, que recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 1986, em reconhecimento ao seu trabalho nessa área. Buchanan argumentou que a análise econômica poderia ser aplicada à política, e que as decisões políticas deveriam ser tomadas a partir de um processo que levasse em consideração os interesses de todos os atores envolvidos.
Outro autor importante da teoria da escolha pública é Gordon Tullock, que junto com Buchanan, desenvolveu a ideia de que as políticas públicas são o resultado de um processo de barganha entre os diferentes grupos de interesse, e que a alocação de recursos públicos é determinada pelo poder político dos diferentes grupos envolvidos.
Algumas das principais críticas à teoria da escolha pública apontam para a sua simplificação do processo político, bem como para a sua suposição de que os atores políticos agem sempre de forma racional. Além disso, alguns críticos argumentam que a teoria da escolha pública leva a uma visão limitada da política, que não leva em conta outros fatores importantes, como a cultura, a história e as tradições políticas de um determinado país ou região.
A teoria da escolha racional é uma abordagem teórica que busca explicar o comportamento humano em termos de escolhas racionais e maximização de interesses pessoais. Essa teoria é amplamente utilizada nas ciências políticas, economia e administração pública para analisar decisões individuais e coletivas em diversas áreas, como políticas públicas, tomada de decisão governamental, eleições e organização de empresas.
TEORIA DA ESCOLHA RACIONAL
Uma das principais premissas da teoria da escolha racional é a de que os indivíduos são racionais e buscam maximizar seus interesses e benefícios pessoais diante de uma situação de escolha. Isso significa que os indivíduos avaliam as alternativas disponíveis com base em suas preferências e escolhem aquela que lhes oferece o maior benefício em relação aos custos envolvidos.
Outra premissa importante é a de que os indivíduos possuem informações completas e precisas sobre as alternativas disponíveis e seus respectivos custos e benefícios. Além disso, a teoria da escolha racional considera que os indivíduos são capazes de avaliar e comparar as alternativas disponíveis de forma objetiva e racional.
A teoria da escolha racional é frequentemente aplicada em políticas públicas e tomada de decisão governamental para analisar como os governos tomam decisões em relação a políticas públicas, como alocam recursos e quais são as consequências dessas decisões. A teoria é útil para entender as escolhas feitas pelos governos e os motivos por trás dessas escolhas, bem como as preferências dos eleitores e grupos de interesse.
Dentre os principais autores que desenvolveram a teoria da escolha racional, destacam-se James Buchanan, Gordon Tullock, Anthony Downs e Mancur Olson.
O INCREMENTALISMO
O incrementalismo é uma teoria da tomada de decisão que destaca a natureza gradual e cumulativa do processo de formulação de políticas públicas. Segundo essa teoria, as políticas públicas são desenvolvidas em pequenos passos incrementais ao longo do tempo, em vez de mudanças dramáticas ou radicais.
O incrementalismo tem suas raízes na teoria das ciências políticas e da administração pública, e é frequentemente associado ao trabalho de Charles Lindblom, que o desenvolveu em seu livro "The Science of Muddling Through" (1959). Lindblom argumentou que, dada a complexidade dos problemas enfrentados pelas políticas públicas, é impossível para os formuladores de políticas examinar todas as possíveis alternativas e suas consequências antes de tomar uma decisão. Em vez disso, eles se concentram em soluções incrementais que representam uma continuação gradual das políticas existentes.
Wildasin (1974), Pressman e Wildavsky (1984) e Baumgartner e Jones (1993) são conhecidos por seus estudos sobre o incrementalismo na política pública. O incrementalismo é uma teoria que propõe que as mudanças na política pública ocorrem de maneira gradual e progressiva, em vez de serem resultado de mudanças dramáticas ou revolucionárias.
Wildasin (1974) discute como o processo orçamentário é incrementalista, com as mudanças ocorrendo de forma pequena e gradual a cada ciclo orçamentário. Ele argumenta que as mudanças significativas no processo orçamentário só ocorrem quando há crises financeiras ou políticas.
Pressman e Wildavsky (1984) analisam a implementação de políticas públicas e argumentam que o incrementalismo é uma abordagem comum na implementação de políticas. Eles afirmam que as políticas são implementadas por meio de pequenos ajustes e correções ao longo do tempo, em vez de mudanças drásticas e significativas.
Baumgartner e Jones (1993) argumentam que o incrementalismo é uma característica fundamental da política americana, e que as mudanças políticas ocorrem em pequenos incrementos em vez de mudanças radicais. Eles também enfatizam a importância da agenda política na formulação de políticas públicas, e como a agenda pode mudar gradualmente ao longo do tempo.
Wildasin (1974), Pressman e Wildavsky (1984) e Baumgartner e Jones (1993), portanto, contribuem para a compreensão do incrementalismo na política pública, destacando como as mudanças ocorrem gradualmente e como a agenda política pode afetar a formulação e implementação de políticas públicas. Suas ideias são fundamentais para entender como as políticas públicas evoluem ao longo do tempo e como as mudanças são feitas na prática.
O incrementalismo também enfatiza o papel dos grupos de interesse e da burocracia na tomada de decisões políticas, bem como a importância do consenso e da negociação em vez do confronto e da competição. Essa teoria defende que as mudanças políticas ocorrem através de ajustes graduais nas políticas existentes, que são influenciadas pelos grupos de interesse e pela burocracia.
O modelo incrementalista tem sido criticado por alguns acadêmicos por sua falta de inovação e incapacidade de enfrentar problemas complexos de maneira eficaz. No entanto, outros argumentam que ele é uma abordagem pragmática e realista para a tomada de decisões políticas em um ambiente complexo e em constante mudança.
O INSTITUCIONALISMO
O institucionalismo é uma abordagem teórica que enfatiza a importância das instituições na análise de fenômenos sociais e políticos. Segundo essa teoria, as instituições são construções sociais que moldam o comportamento humano, limitando ou incentivando certas ações e estabelecendo padrões de comportamento aceitáveis.
Uma das principais vertentes do institucionalismo é o institucionalismo histórico, que argumenta que as instituições são o resultado de processos históricos específicos e que, portanto, são difíceis de mudar rapidamente. O institucionalismo também enfatiza o papel das normas, regras e procedimentos na tomada de decisões políticas e na governança.
Thelen (1999), March e Olsen (1984), Hall& Taylor (1996) e Mahoney (2000) enfatizam a importância das instituições na análise política e argumentam que as instituições são moldadas por processos históricos específicos. Eles também destacam o papel das normas, regras e procedimentos na tomada de decisões políticas e na governança.
TEORIA DOS FLUXOS MULTIPLOS
A teoria dos fluxos múltiplos é uma abordagem teórica que se concentra na interação entre atores em diferentes níveis e em diferentes tipos de governança. Essa teoria sugere que as políticas públicas são criadas e implementadas em vários níveis, através de uma rede complexa de atores públicos e privados que trabalham juntos em múltiplos fluxos.
Um dos principais autores dessa teoria é Anne-Marie Slaughter, que apresentou a ideia de que as políticas públicas são criadas em múltiplos fluxos de interação entre governos, organizações internacionais, grupos de interesse e outras partes interessadas. Outro autor importante é Johan Olsen, que desenvolveu a ideia de que as políticas públicas são criadas através da interação entre atores em diferentes níveis e em diferentes arenas.
TEORIA DO EQUILÍBRIO PONTUADO
A teoria do equilíbrio pontuado é uma teoria de mudança política que argumenta que as políticas públicas tendem a permanecer em um estado relativamente estável por longos períodos de tempo, mas podem ser sujeitas a mudanças rápidas e dramáticas em momentos de perturbação política. Essa teoria é frequentemente aplicada em estudos de políticas públicas, em que se busca entender as mudanças na agenda política e na tomada de decisão.
Os principais autores da teoria do equilíbrio pontuado são Baumgartner e Jones. Eles desenvolveram essa teoria em um livro intitulado "Agendas and Instability in American Politics" (1993), em que argumentam que a política pública é caracterizada por períodos de estabilidade pontuados por mudanças rápidas e dramáticas. Eles argumentam que as mudanças são impulsionadas por eventos políticos, como eleições, crises econômicas, mobilização social e mudanças na liderança política.
Outros autores também contribuíram para o desenvolvimento da teoria do equilíbrio pontuado, como Sabatier e Jenkins-Smith em "Policy Change and Learning: An Advocacy Coalition Approach" (1993) e Pierson em "Politics in Time: History, Institutions, and Social Analysis" (2004).
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