Negociação é uma atividade presente em diversas esferas da vida, e no setor público não é diferente. Negociar é buscar chegar a um acordo ou solução que satisfaça as partes envolvidas. No entanto, quando se trata de negociações no setor público, a complexidade é maior, uma vez que existem diversas variáveis a serem consideradas, como interesses políticos, interesses da sociedade, recursos disponíveis, entre outros. Por isso, é importante entender os conceitos básicos da negociação estratégica, que envolve técnicas específicas para se chegar a um acordo que atenda aos interesses de ambas as partes.
Como vimos, a negociação estratégica pode ser definida como um processo em que duas ou mais partes buscam chegar a um acordo mutuamente satisfatório, por meio da utilização de estratégias e técnicas específicas, com o objetivo de alcançar seus interesses e objetivos. A negociação estratégica envolve, portanto, a elaboração de um plano prévio para se chegar ao objetivo desejado, levando em consideração as variáveis envolvidas e as possíveis consequências de cada decisão.
Modelos de negociação: colaborativo, distributivo e integrativo
Existem três modelos de negociação comumente utilizados: colaborativo, distributivo e integrativo. O modelo colaborativo é baseado na cooperação entre as partes envolvidas, com o objetivo de chegar a um acordo que satisfaça ambos os lados. No modelo distributivo, as partes envolvidas buscam maximizar seus próprios interesses, muitas vezes em detrimento do outro lado. Por fim, o modelo integrativo busca a criação de valor para ambos os lados, por meio da identificação de interesses em comum e da busca por soluções criativas que atendam a esses interesses. A seguir, veremos com mais detalhes cada um desses modelos.
Modelo Colaborativo
O modelo colaborativo de negociação, também conhecido como modelo cooperativo ou ganha-ganha, é baseado na cooperação entre as partes envolvidas, com o objetivo de chegar a um acordo que satisfaça ambos os lados. Nesse modelo, as partes buscam identificar interesses comuns e trabalhar juntas para alcançá-los. A comunicação é aberta e transparente, e as partes são encorajadas a expor suas necessidades e preocupações.
O principal autor desse modelo é Roger Fisher, professor emérito da Harvard Law School e co-fundador do Program on Negotiation (PON). Em sua obra "Getting to Yes: Negotiating Agreement Without Giving In", escrita em co-autoria com William Ury e Bruce Patton, Fisher apresenta técnicas e estratégias para alcançar acordos mutuamente satisfatórios, tais como separar as pessoas do problema, focar nos interesses e não nas posições, criar opções de ganho mútuo, entre outras.
Exemplo: Quando duas empresas competidoras decidem se unir em um projeto conjunto para reduzir custos e aumentar a eficiência, essa é uma negociação colaborativa. Ambas as empresas podem se beneficiar da união e, portanto, trabalham juntas para alcançar seus objetivos.
Modelo Distributivo
O modelo distributivo de negociação, também conhecido como modelo de soma zero ou ganha-perde, é baseado na ideia de que o que uma parte ganha, a outra parte perde. Nesse modelo, as partes envolvidas buscam maximizar seus próprios interesses, muitas vezes em detrimento do outro lado.
O principal autor desse modelo é Chester Karrass, fundador do Karrass Negotiating Seminars e autor do livro "The Negotiating Game". Em sua obra, Karrass apresenta técnicas para se obter vantagem nas negociações, tais como controlar a agenda, usar informações a seu favor e pressionar a outra parte.
Exemplo: Quando um comprador e um vendedor negociam o preço de um produto, essa é uma negociação distributiva. O vendedor busca maximizar o preço, enquanto o comprador busca pagar o mínimo possível.
Modelo Integrativo
O modelo integrativo de negociação, também conhecido como modelo de soma não-zero ou ganha-ganha ampliado, busca a criação de valor para ambos os lados, por meio da identificação de interesses em comum e da busca por soluções criativas que atendam a esses interesses. Nesse modelo, as partes envolvidas trabalham juntas para maximizar o valor do acordo para ambas as partes.
O principal autor desse modelo é William Ury, co-autor do livro "Getting to Yes" juntamente com Roger Fisher e Bruce Patton. Em sua obra "The Power of a Positive No", Ury apresenta técnicas para se alcançar acordos que atendam aos interesses de ambas as partes, tais como afirmar os próprios interesses, dizer "não" de forma positiva e apresentar opções que atendam a ambos os lados.
Em qual modelo a venda de um carro usado se encaixaria?
A venda de um carro usado pode se enquadrar em diferentes modelos de negociação, dependendo do tipo de negociação e das estratégias utilizadas pelas partes envolvidas.
Se o vendedor e o comprador estiverem focados em maximizar seus próprios interesses, buscando obter o melhor preço para si mesmos, então a negociação pode ser considerada distributiva. Nesse caso, o vendedor pode estar buscando obter o preço mais alto possível para o carro, enquanto o comprador pode estar buscando pagar o menor preço possível. Cada parte está buscando obter vantagem em detrimento da outra.
Por outro lado, se o vendedor e o comprador estiverem dispostos a trabalhar juntos para encontrar uma solução que atenda a ambos os lados, então a negociação pode ser considerada colaborativa ou integrativa. Nesse caso, as partes podem buscar identificar interesses em comum, tais como a necessidade de um carro confiável para o comprador ou a necessidade de obter um valor justo pelo carro para o vendedor, e trabalhar juntas para chegar a um acordo que atenda a esses interesses.
Portanto, a venda de um carro usado pode se enquadrar em diferentes modelos de negociação, dependendo das estratégias utilizadas pelas partes envolvidas.
O que a assimetria de informação tem a ver com a negociação estratégica?
A assimetria de informação é uma situação em que uma das partes envolvidas na negociação possui mais informações ou conhecimentos relevantes sobre o objeto da negociação do que a outra parte. Essa assimetria pode criar uma vantagem para a parte que detém mais informações, podendo prejudicar a outra parte.
Na negociação estratégica, a assimetria de informação pode ser uma fonte de poder para a parte que possui mais informações. Essa parte pode usar sua vantagem para manipular a negociação, obtendo melhores resultados para si mesma.
Por outro lado, a assimetria de informação também pode ser uma fonte de risco para a parte que possui menos informações. Essa parte pode tomar decisões equivocadas ou ser enganada pela outra parte, prejudicando seus próprios interesses na negociação.
Para lidar com a assimetria de informação na negociação estratégica, é importante que as partes se preparem adequadamente, buscando obter o máximo de informações possíveis sobre o objeto da negociação e sobre a outra parte. Além disso, é importante que as partes se comuniquem de forma clara e transparente, buscando compartilhar informações relevantes e eliminar ou reduzir as discrepâncias de informações entre as partes.
A negociação estratégica também pode envolver o uso de táticas e estratégias para lidar com a assimetria de informação, como a obtenção de informações através de fontes independentes, a realização de perguntas estratégicas e a criação de incentivos para a outra parte compartilhar informações.
De que forma a assimetria de informação pode influenciar o modelo de negociação?
A assimetria de informação pode ocorrer em uma negociação de venda de carro quando o vendedor possui informações sobre os defeitos do veículo que não são conhecidos pelo comprador. Nesse caso, o vendedor pode decidir ocultar essas informações para obter um preço mais alto pelo carro, o que configura uma situação de informação assimétrica.
Por exemplo, o vendedor pode conhecer um defeito no motor do carro que afeta seu desempenho, mas decide não mencionar essa informação para o comprador durante a negociação. Essa falta de informação pode levar o comprador a pagar um preço mais alto pelo carro do que pagaria se conhecesse a situação real do veículo.
Essa situação pode se enquadrar em um modelo de negociação distributiva, uma vez que o vendedor está buscando maximizar seus próprios interesses em detrimento do comprador, ocultando informações importantes sobre o carro para obter um preço mais alto. Nesse modelo, as partes estão em uma posição de competição, buscando obter vantagem uma sobre a outra.
Porém, se o vendedor optar por ser transparente e compartilhar as informações sobre os defeitos do carro com o comprador, buscando encontrar uma solução que atenda aos interesses de ambos, a negociação pode se enquadrar em um modelo colaborativo ou integrativo. Nesse modelo, as partes estão buscando trabalhar juntas para encontrar uma solução que atenda a ambas as partes, ao invés de buscar vantagem em detrimento da outra.
Qual o melhor modelo de negociação para manter o relacionamento com os clientes? E qual o pior modelo?
O melhor modelo de negociação para manter o relacionamento com os clientes é o modelo colaborativo ou integrativo, pois nesse modelo as partes trabalham juntas para encontrar soluções que atendam aos interesses de ambas as partes. Esse modelo é baseado na construção de relações de confiança e parceria a longo prazo, onde as partes buscam criar valor mútuo.
Por exemplo, imagine uma empresa de software que deseja manter um relacionamento saudável com seus clientes. Em vez de simplesmente impor seus produtos e serviços, a empresa pode buscar entender as necessidades dos clientes, colaborar com eles para encontrar soluções personalizadas e fornecer suporte e assistência técnica de qualidade. Essa abordagem pode criar um relacionamento de confiança e lealdade do cliente com a empresa, o que pode levar a futuras vendas e indicações.
Por outro lado, o pior modelo de negociação para manter o relacionamento com os clientes é o modelo de competição ou distribuição, onde as partes buscam obter vantagem em detrimento da outra. Esse modelo é baseado em uma abordagem de curto prazo e pode levar a resultados negativos para ambas as partes.
Por exemplo, se uma empresa adota uma abordagem agressiva de vendas, impondo seus produtos e serviços aos clientes sem considerar suas necessidades e interesses, isso pode levar a uma perda de confiança e lealdade dos clientes, o que pode levar a uma redução nas vendas e à má reputação da empresa no mercado.
Estratégias de negociação: competição, acomodação, compromisso, evasão e colaboração
Existem cinco estratégias de negociação: competição, acomodação, compromisso, evasão e colaboração. A estratégia de competição é utilizada quando uma das partes busca maximizar seus próprios interesses, sem levar em consideração o outro lado. A estratégia de acomodação, por sua vez, é utilizada quando uma das partes cede aos interesses da outra parte, em detrimento dos próprios interesses. Já a estratégia de compromisso busca uma solução intermediária que satisfaça ambos os lados, por meio de concessões mútuas. A estratégia de evasão é utilizada quando uma das partes não tem interesse em negociar, ou quando as condições não são favoráveis para se chegar a um acordo. Por fim, a estratégia de colaboração busca a criação de valor para ambas as partes, por meio da identificação de interesses em comum e da busca por soluções criativas que atendam a esses interesses.
Em quais situações cada uma dessas estratégias de negociação será mais adequada?
Competição: Essa estratégia de negociação é caracterizada pela busca de vantagem em detrimento da outra parte. Um exemplo pode ser um processo de licitação, onde várias empresas competem para fornecer um produto ou serviço ao governo. Nessa situação, as empresas buscam oferecer o preço mais baixo e as melhores condições para garantir o contrato. A competição pode ser adequada quando há poucas oportunidades disponíveis e a outra parte é vista como um adversário.
Para Kenneth Thomas, autor de "Gestão de Conflitos e Negociação", a competição pode ser uma estratégia eficaz em situações onde as partes têm metas claras e objetivas, e a negociação é vista como um jogo de soma zero, em que um ganha e o outro perde. Já para William Ury e Roger Fisher, autores de "Como Chegar ao Sim", a competição pode ser perigosa, pois pode levar a um impasse e a um resultado insatisfatório para ambas as partes.
Acomodação: Essa estratégia de negociação é caracterizada pela concessão em benefício da outra parte. Um exemplo pode ser um funcionário que cede a uma solicitação do chefe, mesmo que isso possa prejudicá-lo, para manter um bom relacionamento com ele. A acomodação pode ser adequada quando a outra parte tem uma posição de poder superior ou quando é importante manter um bom relacionamento.
Para Ury e Fisher, a acomodação pode ser uma estratégia útil em situações onde a outra parte tem um poder substancial ou quando a manutenção de um relacionamento é mais importante do que o resultado da negociação. Já para Thomas, a acomodação pode ser uma estratégia arriscada, pois pode levar a um resultado insatisfatório e a uma perda de credibilidade.
Compromisso: Essa estratégia de negociação é caracterizada pela concessão mútua. Um exemplo pode ser um casal que decide dividir as tarefas domésticas de forma equitativa, de modo que cada um tenha responsabilidades iguais. O compromisso pode ser adequado quando as partes têm interesses conflitantes e precisam encontrar uma solução que atenda parcialmente aos interesses de ambas as partes.
Para Ury e Fisher, o compromisso pode ser uma estratégia eficaz em situações onde as partes têm interesses divergentes e não podem chegar a uma solução que atenda plenamente a ambas as partes. Para Thomas, o compromisso pode ser uma estratégia adequada em situações onde as partes têm objetivos claros e não estão dispostas a ceder em questões importantes.
Evasão: Essa estratégia de negociação é caracterizada pela falta de envolvimento na negociação. Um exemplo pode ser um consumidor que decide não fazer uma compra porque não concorda com o preço. A evasão pode ser adequada quando a outra parte é vista como uma ameaça ou quando os custos da negociação são maiores do que os benefícios.
Para Ury e Fisher, a evasão pode ser uma estratégia útil em situações onde a outra parte é hostil ou quando a negociação não é essencial para alcançar os objetivos. Para Thomas, a evasão pode ser uma estratégia arriscada, pois pode levar a uma perda de oportunidades e a um enfraquecimento da posição.
Colaboração: Essa estratégia de negociação é caracterizada pela busca conjunta de soluções criativas que atendam aos interesses de ambas as partes. Um exemplo pode ser uma empresa que colabora com seus clientes para criar um produto personalizado que atenda às suas necessidades específicas. A colaboração pode ser adequada quando as partes têm interesses comuns e desejam criar valor mútuo.
Para Ury e Fisher, a colaboração pode ser a melhor estratégia em situações onde as partes têm interesses comuns e desejam criar valor mútuo. Para Thomas, a colaboração pode ser uma estratégia eficaz em situações onde as partes têm objetivos claros e desejam criar um resultado criativo e mutuamente benéfico.
É importante ressaltar que não há uma estratégia de negociação "certa" ou "errada", e que cada situação pode exigir uma abordagem diferente. Cabe às partes envolvidas identificar seus interesses e prioridades e escolher a estratégia mais adequada para alcançar seus objetivos.
Conclusão
Conhecer esses conceitos básicos é fundamental para que os negociadores possam selecionar as estratégias e técnicas mais adequadas para cada situação, levando em consideração as variáveis envolvidas e os objetivos a serem alcançados. Além disso, é importante lembrar que a negociação estratégica no setor público deve levar em consideração os interesses da sociedade e buscar soluções que atendam ao bem comum.
Em resumo, a negociação estratégica é um processo complexo que envolve a utilização de modelos e estratégias específicas para se chegar a um acordo mutuamente satisfatório. Os negociadores devem estar preparados para lidar com variáveis diversas e considerar o bem comum em suas decisões. O próximo capítulo deste livro irá explorar as habilidades necessárias para ser um negociador eficiente no setor público.
Referências bibliográficas
KARRASS, Chester. The Negotiating Game: How to Get What You Want. 2nd ed. San Francisco: Jossey-Bass Publishers, 1999.
THOMAS, K. W. Gestão de Conflitos e Negociação. São Paulo: Cengage Learning, 2009.
URY, W.; FISHER, R. Como Chegar ao Sim: A Negociação de Acordos sem Concessões. 2. ed. Rio de Janeiro: Best Seller, 1991.