Controle interno no Poder Executivo Federal brasileiro: Organização e competências
Renor Antonio Antunes Ribeiro
Resumo
O controle interno, o sistema de controle interno e a auditoria interna governamental são ferramentas fundamentais para a administração pública brasileira, sendo essenciais para garantir a transparência e a efetividade dos processos e atividades governamentais. A legislação federal brasileira reconhece a importância do controle interno e da auditoria interna governamental, e estabelece a organização e competências dos órgãos que compõem o sistema de controle interno. Nesse sentido, o presente estudo teve como analisar a organização e competências do controle interno no Poder Executivo Federal brasileiro. Para tanto, os objetivos específicos são: a) conceituar o controle interno e o sistema de controle interno segundo a literatura; b) descrever a estrutura organizacional e competências do sistema de controle interno segundo a legislação federal brasileira; e d) analisar como o controle social pode contribuir para o aprimoramento do controle interno no Poder Executivo Federal. A metodologia adotada será a de uma pesquisa descritiva, com abordagem qualitativa, por meio de análise de dados secundários, em fontes bibliográficas e documentais. Como resultados, observou-se um desalinhamento entre os conceitos da literatura e as disposições da Lei n° 10.180/2001 e o Decreto nº 3.591/2000 , considerando-se que a auditoria interna não é o único instrumento do sistema de controle interno, mas sim uma parte integrante que deve trabalhar em colaboração com outras áreas para garantir a efetividade e eficiência do sistema como um todo.
Palavras-chave: auditoria interna, controle interno, sistema de controle interno, gestão pública, Poder Executivo Federal.
Abstract
Internal control, the internal control system and the government's internal audit are fundamental tools for the Brazilian public administration, being essential to ensure the transparency and effectiveness of government processes and activities. Brazilian federal legislation recognizes the importance of internal control and governmental internal auditing, and establishes the organization and powers of the bodies that make up the internal control system. In this sense, this study aimed to analyze the organization and competencies of internal control in the Brazilian Federal Executive Branch. Therefore, the specific objectives are: a) to conceptualize the internal control and the internal control system according to the literature; b) describe the organizational structure and competences of the internal control system according to the Brazilian federal legislation; and d) analyze how social control can contribute to the improvement of internal control in the Federal Executive Branch. The methodology adopted will be that of a descriptive research, with a qualitative approach, through analysis of secondary data, in bibliographic and documentary sources. As a result, there was a misalignment between the concepts in the literature and the provisions of Law No. 10,180/2001 and Decree No. 3,591/2000 , considering that the internal audit is not the only instrument of the internal control system, but rather an integral part that must work in collaboration with other areas to ensure the effectiveness and efficiency of the system as a whole.
Keywords: internal audit, internal control, internal control system, public management, Federal Executive Branch.
1 Introdução
O controle interno é uma atividade essencial para a garantia da efetividade, eficiência e eficácia na gestão pública. No contexto do Poder Executivo Federal brasileiro (PEF), o controle interno é organizado por um sistema, integrado por diversos órgãos com diferentes competências, a exemplo da Secretaria Federal de Controle Interno (SFC), órgão vinculado à Controladoria-Geral da União (CGU), que exerce o papel de órgão central de controle interno do PEF (BRASIL, 2001). Nesse sentido, compreender a organização e competências do controle interno no Poder Executivo Federal, para promover a prestação de contas à sociedade na fiscalização da despesa pública, é fundamental para o fortalecimento do controle e aprimoramento da gestão pública.
A justificativa para esta pesquisa está na importância da sociedade conhecer e analisar o funcionamento do controle interno no Poder Executivo Federal brasileiro, para ter mais instrumentos de accountability dos gastos públicos. Nesse sentido, a pergunta de pesquisa consiste em saber: como é organizado e quais são as competências do controle interno no Poder Executivo Federal brasileiro?
O objetivo geral deste estudo é analisar a organização e competências do controle interno no Poder Executivo Federal brasileiro. Para tanto, os objetivos específicos são: a) conceituar o controle interno e o sistema de controle interno segundo a literatura; b) descrever a estrutura organizacional e competências do sistema de controle interno segundo a legislação federal brasileira; e d) analisar como o controle social pode contribuir para o aprimoramento do controle interno no Poder Executivo Federal.
A metodologia adotada será a de uma pesquisa descritiva, com abordagem qualitativa, por meio de análise de dados secundários, em fontes bibliográficas e documentais. Diante disso, este estudo pretende contribuir para o debate sobre a organização e competências do controle interno no Poder Executivo Federal, fornecendo subsídios para aprimoramento da gestão pública e promoção da accountability.
2 Referencial teórico
Nos itens a seguir, abordaremos os conceitos de controle interno, sistema de controle interno, auditoria interna governamental e suas funções no âmbito da administração pública, abrangendo ainda as semelhanças e diferenças entre esses conceitos e como eles se relacionam entre si.
2.1 O controle interno
Di Pietro (2019), aborda o controle interno como uma das funções da administração pública, que tem como objetivo garantir a legalidade, eficiência, eficácia e economicidade na gestão dos recursos públicos, destacando o controle interno é exercido por órgãos próprios da administração pública, sendo responsável por avaliar a execução dos programas de trabalho e a conformidade das ações com as metas estabelecidas. Lynn Jr. e Hill (2012) afirmam que o controle interno é fundamental para a gestão de riscos e para a tomada de decisões baseadas em informações confiáveis e precisas.
Carvalho Filho (2017) afirma que o controle interno é uma das funções da administração pública, que tem por objetivo fiscalizar e avaliar a gestão dos recursos públicos, buscando garantir a legalidade, a eficiência, a eficácia e a economicidade dos atos administrativos, defendendo que o controle interno é exercido por órgãos próprios da administração, sendo responsável por realizar auditorias, avaliar os resultados das atividades e acompanhar a execução dos programas.
Bresser-Pereira (2017) defende a importância do controle interno como uma das formas de garantir a transparência e a accountability na gestão pública, de forma que o controle interno é um instrumento fundamental para garantir que os recursos públicos sejam utilizados de forma eficiente e eficaz, e que os gestores públicos sejam responsáveis e prestem contas à sociedade. Além disso, Moore (1995), destaca a importância do controle interno na busca pela entrega de serviços públicos de qualidade e valor para a sociedade.
Martins (2019) apresenta a auditoria interna como um importante instrumento do controle interno, responsável por avaliar a eficácia e a eficiência dos controles internos, bem como a conformidade dos atos e fatos administrativos, a qual deve ser exercida de forma independente e objetiva, buscando contribuir para a melhoria da gestão pública. Nesse diapasão, a CGU (2017) apresenta a auditoria interna como um dos principais instrumentos de controle interno, responsável por avaliar a gestão pública, contribuir para a melhoria dos processos e da eficiência na aplicação dos recursos públicos.
O controle interno é estruturado em um sistema, pois segundo Martins (2019) e Meirelles (2017), a estruturação do controle interno deve levar em conta a necessidade de independência e autonomia, bem como a utilização de tecnologias da informação e comunicação para aprimoramento dos controles. Além disso, é importante que haja coordenação entre os diferentes órgãos e entidades que compõem o sistema de controle interno para que a atuação seja integrada e eficiente (CGU, 2017; MARTINS, 2019). Diante do fato da importância dada a estruturação e competências em um sistema, falaremos sobre o sistema de controle interno.Parte superior do formulário
2.2 O sistema de controle interno
O sistema de controle interno pode ser entendido como o conjunto de mecanismos, estruturas e procedimentos utilizados pela administração pública para garantir a legalidade, a eficiência, a efetividade e a transparência das suas atividades e ações (BOVENS e ZOURIDIS, 2002; MIHÁLYI e CZIBIK, 2019; O'DONNELL, 1998; SPENCELEY, KOOPMAN E PRETORIUS, 2014).
Spenceley, Koopman e Pretorius (2014) afirmam que o sistema de controle interno deve ser composto por três elementos principais: a avaliação de riscos, a monitoração contínua e a auditoria interna. Os autores ressaltam que o sistema deve ser flexível e adaptável às mudanças no ambiente externo, e deve ser capaz de identificar e responder rapidamente a possíveis problemas. Para Bovens e Zouridis (2002), o sistema de controle interno evoluiu de níveis individuais para níveis sistêmicos, em que as tecnologias de informação e comunicação (TIC) têm um papel cada vez mais importante, enfatizando a necessidade de adaptar as práticas de controle interno para lidar com os desafios impostos pelas TIC.
O'Donnell (1998) enfatiza que o sistema de controle interno é uma parte importante da accountability horizontal, ou seja, do controle exercido por instituições que têm poderes semelhantes, sendo que o sistema deve incluir mecanismos de supervisão e monitoramento, além de garantir a prestação de contas à sociedade.
Mihályi e Czibik (2019) afirmam que o sistema de controle interno é essencial para a promoção da accountability e da transparência na administração pública, e deve ser composto por mecanismos que garantam a conformidade com leis e regulamentos, o uso eficiente dos recursos públicos e a efetividade das políticas públicas. Bovens e Zouridis (2002) destacam que o sistema de controle interno deve ser capaz de detectar e prevenir a corrupção e outros desvios e deve ser composto por elementos como a auditoria interna, a avaliação de desempenho e a gestão de riscos. Por fazer parte do sistema, abordaremos a auditoria interna e sua relação com o sistema de controle interno.
2.3 A auditoria interna e o sistema de controle interno
A auditoria interna pode ser definida como uma atividade independente e objetiva que visa avaliar a eficácia dos controles internos, identificar riscos e recomendar ações corretivas para melhorar os processos de gestão e governança de uma organização (CGU, 2017; MARTINS, 2019).
Segundo Mihályi e Czibik (2019), a auditoria interna é uma das ferramentas do sistema de controle interno, sendo responsável por avaliar a eficácia e eficiência dos controles internos existentes na organização. Bovens e Zouridis (2002) destacam que a auditoria interna é um componente importante do sistema de controle interno, sendo responsável por fornecer informações relevantes para a tomada de decisão e para a melhoria contínua dos processos e procedimentos internos. O'Donnell (2001) ressalta que a auditoria interna é um mecanismo essencial para o controle interno, permitindo a identificação de irregularidades, fraudes e ineficiências. Já Spenceley Koopman e Pretorius (2014) destacam que a auditoria interna é uma atividade-chave no âmbito do sistema de controle interno, sendo responsável por avaliar a efetividade das medidas de controle adotadas pela organização.
Além disso, a auditoria interna é incluída como terceira linha no modelo das três linhas de defesa, que divide a responsabilidade pela gestão de riscos e controles entre a linha de negócios, a gestão de riscos e a auditoria interna, para a melhoria da efetividade do controle interno (BAINES e LANGFIELD-SMITH, 2018; CARVALHO et al., 2017; PAGADUAN e LOPEZ, 2018; SALAZAR e OLIVEIRA, 2020; SEDA e SORENSEN, 2020; SILVA et al., 2018). Segundo Baines e Langfield-Smith (2018), esse modelo pode aumentar a efetividade do controle interno e permitir uma abordagem mais integrada à gestão de riscos. Já Hansen, Seda e Sorensen (2020) argumentam que a colaboração entre as três linhas é fundamental para garantir a efetividade do controle interno. Por sua vez, Pagaduan e Lopez (2018) enfatizam que a auditoria interna deve ser independente e objetiva para realizar avaliações efetivas do controle interno.
De acordo com Carvalho et al. (2017), a auditoria interna é essencial no modelo das três linhas de defesa, pois aprimora a gestão de riscos e o controle interno nas organizações. Já Lima e Victorino (2019) destacam que o modelo das três linhas de defesa busca integrar o papel do controle interno, gestão de riscos e da auditoria interna para garantir uma maior efetividade na governança corporativa. Salazar e Oliveira (2020) afirmam que o modelo das três linhas de defesa é uma estratégia que visa fortalecer o controle interno e a auditoria interna, e que a responsabilidade pela gestão de riscos é compartilhada entre as três linhas. Por fim, Silva et al. (2018) afirmam que o modelo das três linhas de defesa é uma abordagem moderna para gestão de riscos e controles internos, e que a auditoria interna desempenha um papel importante na verificação da efetividade dos controles internos e na identificação de oportunidades de melhoria.
2.4 Semelhanças e Diferenças entre controle interno e sistema de controle interno
Segundo Kihara e Matsumura (2014), o controle interno é uma das atividades realizadas pelo sistema de controle interno, que também envolve a auditoria interna e outras atividades relacionadas à gestão de riscos e ao cumprimento de normas. Nesse sentido, o sistema de controle interno é mais abrangente e complexo que o controle interno isoladamente. Já para Silva (2017), o controle interno é uma das dimensões do sistema de controle interno, que inclui ainda o controle externo e o controle social. Ambos os autores concordam que o objetivo do sistema de controle interno é garantir a efetividade e eficiência da gestão pública, bem como a observância das normas legais e regulamentares.
Com relação às diferenças, Kihara e Matsumura (2014) destacam que o controle interno se concentra nas atividades da organização, enquanto o sistema de controle interno envolve a análise do ambiente em que a organização está inserida. Além disso, o sistema de controle interno requer a participação de diferentes atores e o estabelecimento de mecanismos de coordenação e cooperação entre eles, como forma de garantir a abrangência e a eficácia das atividades de controle.
Após compreendermos os conceitos de controle interno e auditoria interna, bem como sua relação com o sistema de controle interno, faz-se necessário entender como esse sistema é organizado e quais são suas competências no âmbito da administração pública. No contexto brasileiro, a legislação estabelece as diretrizes e normas para o funcionamento do sistema de controle interno no PÈF, o que inclui a definição das atribuições e responsabilidades dos órgãos que compõem esse sistema. Nesse sentido, é fundamental analisar as disposições legais que regem a organização e as competências do sistema de controle interno no PEF, a fim de compreender como esse sistema funciona na prática e como ele contribui para a melhoria da gestão pública.
3 Organização e competências do sistema de controle interno no PEF, segundo a legislação.
A organização e competências do sistema de controle interno no PEF são definidas por meio de normas e leis específicas. Conforme a Constituição Federal brasileira de 1988 (CF/88), o sistema de controle interno do PEF é responsável por realizar a avaliação da gestão pública, da execução orçamentária e financeira, e do cumprimento das metas estabelecidas no Plano Plurianual (BRASIL, 1988). Além disso, tem como objetivo garantir a legalidade, a eficiência, a efetividade e a transparência na aplicação dos recursos públicos, por meio da fiscalização e acompanhamento dos atos e fatos administrativos (BRASIL, 1988). Sendo assim, é fundamental conhecer as competências e a estrutura do sistema de controle interno no PEF para compreender como ocorre o processo de fiscalização e controle da administração pública no Brasil.
De fato, a CF/88 tratou do sistema de controle interno nos artigos 31, 40, 70 e 74. No caso dos municípios, o sistema de controle interno é responsável por fiscalizar o município juntamente com o controle externo.
Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei (BRASIL, 1988)
Por sua vez, o artigo 40 da CFb/88 tornou necessário que haja controle interno sobre a gestão dos recursos relativos aos seus regimes previdenciários.
Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
(...)
VII - estruturação do órgão ou entidade gestora do regime, observados os princípios relacionados com governança, controle interno e transparência (BRASIL, 1988).
De acordo com a CF/88, o sistema de controle interno dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário é responsável por uma ampla gama de fiscalizações de competência da União, incluindo fiscalizações contábeis, financeiras, orçamentárias, operacionais e patrimoniais.
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder (BRASIL, 1988).
De acordo com a CF/88, a manutenção de um sistema de controle interno é atribuição dos três Poderes, exercido sobre os instrumentos orçamentários, quais sejam, o Plano Plurianual - PPA, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual - LOA, que abrangem a aplicações de dinheiros na execução das políticas públicas, bem como créditos, garantias, direitos , e bens da União.
Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:
I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;
II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;
III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;
IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
§ 1º Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária (BRASIL, 1988).
De acordo com o Artigo 74 da CF/88 (BRASIL, 1988), o controle interno é um conjunto de medidas adotadas pelos órgãos responsáveis para garantir o cumprimento das leis e o alcance dos objetivos previstos nos programas de trabalho. O controle interno inclui a avaliação da execução dos programas de governo e dos orçamentos, a verificação da legalidade e a avaliação dos resultados em relação à eficácia e eficiência da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado (BRASIL, 1988). Além disso, o controle interno exerce o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União, e apoia o controle externo no exercício de sua missão institucional (BRASIL, 1988).
A Lei 4.320/1964 tratou do controle interno, estabelecendo que o Poder Executivo exercerá os três tipos de controle do art. 75. Os artigos 54 e 59 da Lei Complementar nº 101/2000, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal versam sobre as responsabilidades do Sistema de Controle Interno (BRASIL, 1964).
O artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 200/1967, estabeleceu um modelo de controle interno com três linhas ou camadas, sendo a primeira linha da responsabilidade da gestão, a segunda linha exercida por órgãos específicos e a terceira exercida pelos órgãos do sistema de contabilidade e auditoria (BRASIL, 1967).
Art. 13 O contrôle das atividades da Administração Federal deverá exercer-se em todos os níveis e em todos os órgãos, compreendendo, particularmente:
a) o contrôle, pela chefia competente, da execução dos programas e da observância das normas que governam a atividade específica do órgão controlado;
b) o contrôle, pelos órgãos próprios de cada sistema, da observância das normas gerais que regulam o exercício das atividades auxiliares;
c) o contrôle da aplicação dos dinheiros públicos e da guarda dos bens da União pelos órgãos próprios do sistema de contabilidade e auditoria (BRASIL, 1967)
A Lei n° 10.180/2001 (BRASIL, 2001) e o Decreto nº 3.591/2000 (BRASIL, 2000) regulamentaram o sistema de controles internos no âmbito específico do PEF, de modo que o artigo 22 da Lei nº 10.180/2001 define o sistema sistema de controle interno como um conjunto de órgãos de auditoria interna governamental, do qual fazem parte a CGU como órgão central e órgãos setoriais de controle interno, a exemplo das Secretarias Setoriais de Controle Interno dos Ministérios das Relações Exteriores, da Defesa, da Advocacia-Geral da União e da Casa Civil, tendo como técnicas do sistema de controle interno a auditoria e a fiscalização.
De acordo com a Lei nº 10.180/2001 e o Decreto nº 3.591/2000, os órgãos setoriais de controle interno foram denominados Secretarias de Controle Interno (CISET). No Decreto nº 3.591/2000, as unidades de auditoria interna da administração indireta estão subordinadas à orientação normativa e à supervisão técnica do Órgão Central e dos órgãos setoriais do sistema, sendo incluídas como órgãos auxiliares.
De acordo com a Lei 10.180/2001, o sistema de controle interno compreende a auditoria, que tem por finalidade avaliar a eficácia e eficiência dos controles internos, e a fiscalização, que tem por finalidade apurar responsabilidade por infração praticada no âmbito do órgão ou entidade. Já o Decreto 3.391/2000 estabelece que o sistema de controle interno tem como uma de suas atividades a auditoria, que deve ser realizada por unidade de auditoria interna ou por órgão central de controle interno, de acordo com o disposto em normas específicas.
A Instrução Normativa Conjunta MP/CGU n° 01 de 2016 (BRASIL, 2016) estabelece normas e diretrizes para o funcionamento do sistema de controle interno do Poder Executivo Federal, e também trata dos controles internos da gestão, que são realizados pelos órgãos e entidades para avaliar e aprimorar os processos de gestão e os controles internos. Nessa norma, os controles internos da gestão são realizados pelos gestores e pelos setores responsáveis pelos processos de trabalho, visando avaliar e aprimorar a efetividade e a eficiência das ações e dos controles internos. Esses controles incluem atividades como a análise de riscos, a definição de indicadores de desempenho, a revisão e atualização de normas e procedimentos, entre outras (BRASIL, 2016).
O Decreto 9.203/2017 estabelece a Política de Governança da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, estabelecendo diretrizes e mecanismos de liderança, estratégia e controle para aprimorar a eficiência, a efetividade e a transparência das políticas e das atividades públicas. Nesse contexto a implementação dos controles internos e a adoção de gestão de riscos e de medidas corretivas quando necessárias faz parte da governança pública (BRASIL, 2017).
Por sua vez, a Lei nº 14.133/2021, trata do controle interno em vários artigos, a exemplo dos artigos 7º, 8°, 19, 24, 117, 141, 169 e 170, prevendo que o sistema de controle interno deve atuar no sentido de garantir a efetividade dos controles internos da gestão e a legalidade, a legitimidade, a economicidade e a eficiência das contratações públicas, sendo organizado em três linhas de defesa. Para isso, a lei estabelece a obrigatoriedade de que as unidades de controle interno realizem ações de acompanhamento e supervisão das etapas do processo licitatório, bem como da execução dos contratos decorrentes (BRASIL, 2021). Além disso, essa lei determina que os controles internos da gestão devem ser aplicados em todas as fases do processo licitatório e da execução contratual, com o objetivo de assegurar a conformidade com as normas aplicáveis, a qualidade e a eficiência dos serviços prestados (BRASIL, 2021). A lei também prevê a possibilidade de responsabilização dos gestores públicos e dos agentes envolvidos em caso de descumprimento das normas e das obrigações relacionadas ao sistema de controle interno e aos controles internos da gestão (BRASIL, 2021).
A IN CGU n° 08/2017, adotou definições tanto do Decreto nº 3.591/2000 quanto do Decreto-Lei n° 200/1967, ao classificar as auditorias internas como órgãos auxiliares do sistema de controle interno e também posicionando todos os órgãos de auditoria interna governamental, incluindo das auditorias internas da administração indireta, na terceira linha de defesa.
Diante do exposto, passaremos a discussão do controle interno, sistema de controle interno e auditoria interna governamental em cotejo com os autores consultados, para sabermos a compatibilidade entre os conceitos da legislação e os argumentos defendidos na literatura.
4 Discussão
Por meio do estudo dos autores consultados e da legislação federal, percebeu-se que os conceitos tratados na CF/88, nas leis, decretos e instruções normativas, são, em geral, alinhados com a literatura, no que se refere ao controle interno, sistema de controle interno e auditoria interna. Além disso, o Decreto-Lei n.º 200/1967, a IN CGU n° 08/2017 e a Lei nº 14.133/2021 trataram do controle interno e da auditoria interna como órgão de terceira linha, em consonância com a literatura.
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a obrigatoriedade da existência de um sistema de controle interno para todas as esferas e Poderes da administração pública, com o objetivo de avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e o orçamento.
Já a Lei 10.180/2001 estabelece as diretrizes para a organização e o funcionamento do sistema de controle interno do Poder Executivo federal, definindo suas competências, responsabilidades e forma de atuação. Segundo essa lei, o sistema de controle interno deve ser integrado por unidades de controle interno e auditoria interna, que atuam de forma independente e complementar (BRASIL, 2001). As unidades de controle interno, que são órgãos de auditoria interna governamental, são responsáveis por promover a avaliação contínua do desempenho e dos resultados da gestão, verificando a legalidade, a legitimidade, a economicidade, a eficiência e a eficácia dos atos administrativos, enquanto a auditoria interna tem por objetivo avaliar a efetividade dos controles internos existentes na organização (BRASIL, 2001).
O Decreto 3.591/2000, por sua vez, estabeleceu as normas para a execução da Lei 10.180/2001, que trata da organização e do funcionamento da administração federal. O decreto reforçou a importância da atuação dos órgãos de auditoria interna como integrantes do sistema de controle interno no âmbito da administração pública federal, destacando a necessidade de uma atuação integrada e coordenada entre eles para garantir a efetividade do sistema, tendo a auditoria como técnica do sistema.
Ocorre que, tanto a Lei 10.180/2001 quanto o Decreto 3.391/2000 estabelecem uma organização e competências do sistema de controle interno em discordância com o disposto na literatura, considerando que a auditoria interna é uma das principais ferramentas utilizadas pelas organizações para garantir a efetividade e eficiência do sistema de controle interno, mas não a única. De acordo com Carvalho et al. (2017), a auditoria interna é responsável por avaliar o sistema de controle interno, identificar falhas e propor melhorias, atuando como um importante mecanismo de monitoramento e aprimoramento do sistema, mas não a sua única integrante.
Nesse sentido, Mihályi e Czibik (2019), Bovens e Zouridis (2002), O'Donnell (1998) e Spenceley et al. (2014), enquadram a auditoria interna como parte do sistema de controle interno, considerando-a como a terceira linha de defesa, responsável por avaliar a efetividade das duas primeiras linhas de defesa, que são compostas pelas áreas de negócio e pelos responsáveis pelo controle interno.
Lima e Victorino (2019), Salazar e Oliveira (2020) e Silva et al. (2018), por sua vez, defendem que a auditoria interna não deve ser vista apenas como uma terceira linha de defesa, mas sim como uma parte integrante do sistema de controle interno, atuando em colaboração com as áreas de negócio e os responsáveis pelo controle interno para garantir a efetividade do sistema como um todo.
Diante dessas reflexões, é possível perceber a importância da auditoria interna como parte do sistema de controle interno, mas não como o sistema de controle interno em si, como disposto na Lei 10.180/2001 quanto o Decreto 3.391/2000. É fundamental que a auditoria seja vista como um mecanismo de melhoria contínua do sistema, em colaboração com as outras áreas da organização e não como o controle interno em si. Para o efetivo funcionamento do sistema de controle interno, é necessário que os órgãos e entidades do setor público promovam a integração e a sinergia entre as diferentes áreas envolvidas no sistema de controle interno, visando garantir a efetividade e eficiência do sistema como um todo.
5 Conclusão
O controle interno, o sistema de controle interno, a auditoria interna governamental e a organização e competências dos órgãos que compõem o sistema são temas de extrema relevância para a administração pública brasileira, pois o sistema de controle interno é uma ferramenta fundamental para garantir a accountability e a efetividade e a eficiência dos processos e atividades governamentais.
De forma geral, é possível afirmar que a legislação federal brasileira reconhece a importância do controle interno, sistema de controle interno e auditoria interna governamental como ferramentas fundamentais para garantir a transparência, a efetividade e a eficiência da gestão pública. Em cotejo com os autores citados, percebe-se que existe um alinhamento geral entre os conceitos de controle interno, sistema de controle interno, auditoria interna e o modelo das linhas de defesa positivado na legislação brasieira.
No entanto, foi observado um desalinhamento entre os conceitos da literatura e as disposições da Lei 10.180/2001 quanto o Decreto 3.391/2000, tendo em vista que, de acordo com os autores consultados, a auditoria não é o único instrumento do sistema de controle interno, mas integra um conjunto de entidades que devem atuar em conjunto para a garantia da efetividade do sistema como um todo. Com efeito, a literatura aponta a importância da auditoria interna como parte integrante do sistema de controle interno, trabalhando em colaboração com as outras áreas das organizações para garantir a efetividade e eficiência do sistema como um todo.
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