A era moderna tem sido marcada por uma série de transformações significativas em diversos aspectos da sociedade, incluindo o econômico, político, tecnológico e social. O ritmo acelerado dessas mudanças tem trazido desafios para indivíduos, organizações e governos, que precisam se adaptar constantemente a novas realidades e formas de atuação. Além disso, a complexidade e a incerteza que permeiam esse cenário exigem que sejam desenvolvidas novas habilidades e estratégias para lidar com os desafios e aproveitar as oportunidades que surgem. Nesse contexto, a compreensão das mudanças e desafios da era moderna é fundamental para que se possa antecipar e responder adequadamente às demandas do mundo contemporâneo.
Mundos VUCA e BANI
O mundo está mudando rapidamente, e as organizações precisam se adaptar constantemente para sobreviver e prosperar. O que antes era estável e previsível, agora é caracterizado por incerteza, complexidade, ambiguidade e instabilidade. Esse ambiente volátil e imprevisível é conhecido como mundo VUCA, um acrônimo que significa Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity.
O mundo VUCA é caracterizado por mudanças disruptivas que podem impactar a qualquer momento, e as organizações precisam estar preparadas para enfrentar esses desafios. A velocidade das mudanças pode ser tão rápida que as organizações podem perder o controle das situações e não conseguem acompanhar o ritmo das transformações. Portanto, as organizações precisam ser mais ágeis, inovadoras e flexíveis para se adaptarem rapidamente.
O conceito do mundo VUCA surgiu no final da Guerra Fria no final da década de 1980, sendo utilizado inicialmente pelo exército dos Estados Unidos para descrever o ambiente global em constante mudança e incerteza que se formou após a queda do Muro de Berlim. Posteriormente, o termo foi adotado por empresas e organizações que passaram a enfrentar desafios similares, como a globalização, as mudanças tecnológicas e as incertezas políticas e econômicas.
Além do mundo VUCA, outra abordagem tem surgido recentemente, chamada de mundo BANI. O mundo BANI é caracterizado por quatro características principais: Brittle (Frágil), Anxious (Ansioso), Non-linear (Não-linear) e Incomprehensible (Incompreensível). Essas características foram adicionadas ao VUCA para refletir a realidade atual das organizações.
O mundo BANI é frágil porque as organizações são mais vulneráveis a riscos e ameaças, como ciberataques, desastres naturais, crises políticas e pandemias. Além disso, as organizações enfrentam ansiedade constante devido à incerteza, complexidade e mudanças imprevisíveis. O mundo BANI também é não-linear, o que significa que as mudanças podem ocorrer de forma abrupta e imprevisível, não seguindo padrões preestabelecidos. Por fim, o mundo BANI é incompreensível, pois a quantidade de informações disponíveis é vasta e pode ser difícil para as organizações obterem uma visão clara e completa do ambiente em que estão inseridas
Diante desse cenário desafiador, as organizações precisam adotar uma abordagem mais estratégica em relação à governança, gestão de riscos e integridade. É necessário estabelecer mecanismos de controle interno que permitam às organizações monitorar e gerenciar riscos de forma eficaz, além de desenvolver planos de contingência e de resposta a crises
As organizações também precisam ser mais proativas em relação à gestão de riscos. Não é mais suficiente gerenciar riscos de forma reativa, as organizações precisam antecipar e mitigar riscos antes que eles ocorram. Isso exige uma abordagem mais sistemática e holística, que envolve a identificação, avaliação, tratamento e monitoramento de riscos em toda a organização.
Por fim, as organizações precisam estabelecer uma cultura de integridade, que envolve a adoção de valores éticos e a promoção de comportamentos responsáveis em toda a organização. Isso inclui a implementação de medidas de prevenção e detecção de fraudes, corrupção e outras formas de conduta indevida.
O artigo "What VUCA Really Means for You" de Nathan Bennett e James G. Lemoine explora o conceito de VUCA (Volatility, Uncertainty, Complexity, Ambiguity) e como ele afeta o mundo corporativo. Os autores argumentam que, em vez de simplesmente se adaptar a um ambiente VUCA, as organizações devem aprender a prosperar nele, adotando uma mentalidade de liderança e estratégias que permitam lidar com a incerteza e a complexidade.
Já Corsi, Kjellberg e Rullani (2020), no livro "BANI e a Era Pós-Digital", discutem o conceito de BANI (Brittle, Anxious, Nonlinear, Incomprehensible), que representa as características do mundo pós-digital, onde a tecnologia evolui rapidamente e cria novas formas de incerteza e complexidade. O livro explora as implicações dessas características para os negócios e a sociedade, bem como estratégias para lidar com elas.
As principais ideias desses autores incluem a importância de adaptar-se às mudanças e de desenvolver novas habilidades de liderança e tomada de decisão para enfrentar a incerteza e a complexidade do mundo VUCA. Eles também alertam para os desafios apresentados pelo mundo BANI e propõem medidas para lidar com essas características, como a necessidade de construir resiliência e de desenvolver novas tecnologias e modelos de negócios.
O mundo líquido e a modernidade
O conceito de "mundo líquido" foi introduzido pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman, em seu livro "Modernidade Líquida", publicado em 2000. Nesta obra, Bauman argumenta que a modernidade tradicional, caracterizada pela estabilidade e previsibilidade, foi substituída por uma nova fase da modernidade, que ele chama de "modernidade líquida".
De acordo com Bauman, a modernidade líquida é marcada pela incerteza, instabilidade e fluidez. As estruturas sociais que antes eram sólidas e estáveis agora são mais flexíveis e mutáveis, criando um ambiente de constante mudança e imprevisibilidade. Isso tem impacto em todos os aspectos da vida social, incluindo a economia, a política e a cultura.
A esse respeito, no livro "The Administration of Fear" de Paul Virilio, em 2010, o autor argumenta que a modernidade é caracterizada por uma cultura do medo, onde a tecnologia e a velocidade das mudanças criam novas fontes de ansiedade e insegurança. O autor explora como essa cultura do medo molda a política e a sociedade, e faz uma crítica ao impacto negativo dessa cultura na vida moderna.
Outros autores também abordam a temática da modernidade líquida, incluindo Anthony Giddens em sua obra "As Consequências da Modernidade" (1991) e Manuel Castells em sua trilogia "A Era da Informação" (1996-1998).
A aceleração do ritmo das mudanças na modernidade
A modernidade é caracterizada pela rapidez das mudanças em diversos aspectos da vida, como tecnologia, economia, cultura e sociedade. O avanço da tecnologia tem impulsionado as mudanças, tornando as informações acessíveis de forma instantânea e permitindo a interconexão global em tempo real. As mudanças econômicas têm ocorrido em uma escala cada vez maior, com o surgimento de novos modelos de negócios, mercados globais e uma maior competição.
A cultura e a sociedade também mudam rapidamente, com novas formas de comunicação e interação social, novos valores e comportamentos emergentes. Essas mudanças ocorrem em uma velocidade sem precedentes na história humana, exigindo uma constante adaptação e inovação para se manter relevante e competitivo no mundo moderno.
A respeito das mudanças e dos momentos de crises que elas geram, o livro "Crucibles of Leadership" de Warren Bennis e Robert J. Thomas apresenta a ideia de que grandes líderes são forjados em momentos de crise e desafios, e que esses momentos de pressão são crucíveis que testam e moldam a capacidade de liderança.
Em relação à adaptação das organizações a essas mudanças, no livro "An Everyone Culture", de Robert Kegan e Lisa Lahey, é abordado o conceito de "organizações de desenvolvimento deliberado", que são empresas que priorizam o desenvolvimento pessoal e profissional de seus funcionários como uma estratégia para melhorar a cultura e os resultados de negócios. O livro apresenta casos de estudos de empresas que adotaram essa abordagem e compartilha práticas que outras organizações podem seguir para se tornarem "organizações de desenvolvimento deliberado".
Porque as mudanças estão ocorrendo cada vez mais rápido?
As mudanças estão acontecendo cada vez mais rápido devido ao avanço tecnológico e à globalização. A tecnologia tem permitido a criação e a disseminação de novos produtos, serviços e processos com maior rapidez e eficiência, possibilitando a redução do tempo necessário para desenvolver e implementar soluções inovadoras. Além disso, a globalização aumentou a concorrência entre as empresas e ampliou o acesso a novos mercados, exigindo que as organizações se adaptem constantemente às demandas do mercado. Ainda, fatores como a instabilidade econômica e política, a volatilidade dos preços e a complexidade das relações comerciais também contribuem para acelerar as mudanças no mundo contemporâneo.
Existem muitos exemplos da velocidade das mudanças na modernidade, incluindo:
Tecnologia: a velocidade com que a tecnologia evolui é impressionante. Por exemplo, a primeira geração de telefones celulares foi lançada em 1983 e eram dispositivos grandes e caros. Hoje, temos smartphones que são mil vezes mais poderosos e com preços muito mais acessíveis.
Mídias sociais: o surgimento e crescimento das mídias sociais mudou a forma como as pessoas se comunicam e compartilham informações. O Facebook, por exemplo, foi fundado em 2004 e hoje tem mais de 2 bilhões de usuários ativos mensais.
Mudanças climáticas: as mudanças climáticas estão ocorrendo em um ritmo sem precedentes. A concentração de dióxido de carbono na atmosfera atingiu níveis recordes em 2021, contribuindo para eventos climáticos extremos em todo o mundo.
Demografia: a composição da população mundial está mudando rapidamente. Em muitos países desenvolvidos, o envelhecimento da população está afetando a economia, o mercado de trabalho e os sistemas de saúde.
Globalização: a economia globalizada permite que bens, serviços e informações sejam trocados em uma escala sem precedentes. A integração econômica está mudando a forma como as empresas operam, afetando a competitividade e os empregos.
Revolução industrial e indústria 4.0
A Revolução Industrial, que ocorreu a partir do final do século XVIII na Inglaterra, foi um período de transformações sociais, econômicas e tecnológicas que resultaram em mudanças significativas na forma como a produção era realizada. Foi caracterizada pela transição da manufatura para a produção em massa, com a utilização de máquinas movidas a vapor e a energia elétrica.
Atualmente, estamos vivendo a chamada Indústria 4.0, que é uma nova revolução industrial impulsionada pela tecnologia digital e pela conectividade entre máquinas, sistemas e pessoas. Essa revolução é marcada pela automação de processos, utilização de inteligência artificial e internet das coisas, entre outras tecnologias.
Um dos autores que tratam da Revolução Industrial é Eric Hobsbawm, em sua obra "A era das revoluções: Europa 1789-1848", publicada em 1962. Hobsbawm descreve as transformações ocorridas na sociedade europeia durante o século XIX, que foram impulsionadas pela Revolução Industrial.
Klaus Schwab, em seu livro "A Quarta Revolução Industrial", publicado em 2016. Schwab fala sobre a indústria 4.0 e descreve as mudanças tecnológicas que estão ocorrendo e as implicações para a sociedade e a economia global. Paulo Blikstein, em seu livro "Tecnologia e Educação: Um debate sobre a Indústria 4.0", publicado em 2019. Blikstein discute as transformações na educação que serão necessárias para preparar as novas gerações para a realidade da Indústria 4.0.
Inteligência Artificial
No contexto da nova revolução industrial, a Inteligência Artificial (IA) é um campo da ciência da computação que busca criar máquinas que possam realizar tarefas que, até então, eram exclusivas do ser humano, como a capacidade de aprender, raciocinar, tomar decisões e reconhecer padrões. A IA tem sido cada vez mais utilizada em diversos setores da sociedade, desde a indústria até a medicina e a educação.
Um dos autores mais importantes no estudo da Inteligência Artificial é Stuart Russell, professor de engenharia elétrica e ciência da computação na Universidade da Califórnia, Berkeley. Em seu livro "Inteligência Artificial: uma abordagem moderna", escrito em parceria com Peter Norvig, ele apresenta uma visão abrangente da IA, desde os fundamentos da aprendizagem de máquina até as aplicações mais avançadas.
Outro autor importante na área é Yann LeCun, professor de ciência da computação na Universidade de Nova York e diretor de pesquisa de IA no Facebook. Ele é conhecido por seus estudos sobre redes neurais profundas, um subcampo da IA que tem como objetivo criar algoritmos capazes de aprender de forma autônoma a partir de grandes quantidades de dados.
Além disso, o filósofo Nick Bostrom, diretor do Future of Humanity Institute na Universidade de Oxford, tem se dedicado a estudar os possíveis impactos da IA na sociedade. Em seu livro "Superinteligência: caminhos, perigos, estratégias", ele discute os desafios éticos e políticos que surgem com a criação de máquinas superinteligentes, capazes de superar a capacidade humana em diversas áreas.
Referências Bibliográficas
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